Reviews, como mamilos, são muito polêmicos.
Isto porque é uma tendência natural buscar validação de nossas próprias convicções nas opiniões dos outros. Ao sermos confrontados com uma opinião contrário ao que queremos acreditar, a reação imediata é a desqualificar o contraditório.
Escolha o seu veneno: “a avaliação foi comprada”, “fulano falou bem do jogo por medo de entrar na lista negra da desenvolvedora”, “não sabe jogar”, “não entende nada de videogame”… são inúmeras as opções na tentativa de invalidar uma análise, a vasta maioria delas sem qualquer fundamentação real.
Em um cenário no qual os reviews foram instrumentalizados de forma a serem considerados e desconsiderados conforme alimentam ou não determinadas narrativas (isto por parte dos leitores e não dos avaliadores), com o tempo fui buscando uma relação cada vez mais saudável com análises de jogos. Como alguém que escreve reviews há algum tempo e – principalmente – consome-os há diversas décadas, reforçado por conversas e mais conversas com grandes amigos gamers com as opiniões e gostos mais diversos, comecei a perceber que entender determinadas características dos reviews fazem com que eu possa aproveitá-los melhor para meus próprios objetivos, seja de decisão de compra de um título ou mesmo da comparação de minhas impressões sobre ele com as de outras pessoas.
Se você quer fazer guerrinha de notas na internet ou tem um canal no qual monetiza a guerra de consoles, esta artigo não é para você. Mas se curte ler reviews pelos mesmos motivos que eu, então venha comigo. Esta não é uma lista definitiva sobre reviews de jogos, mas sim ideias que fui aprendendo e desenvolvendo com grandes amigos com o passar dos anos. Você pode concordar com todas, concordar com apenas algumas ou simplesmente discordar de tudo, pois esta é apenas a minha opinião pessoal sobre o consumo de reviews. Falando em pessoal…
Review é pessoal
Embora os grandes portais de jogos tenham ajudado a despersonalizar as análises de jogos, não existe – de fato – “review da IGN”, “review da Gamespot” ou qualquer coisa do tipo. Pessoas jogam e avaliam jogos. Existe o “review da Carol Costa da IGN”, “review do Lucas do Náutilus”, “review do Luiz Belônio do Doze Bits” ou então o “review do Greg Miller do Kinda Funny”.
Como pessoas, por mais que tenhamos a pretensão de sermos imparciais ou não tendenciosos, é impossível nos desnudarmos de nossos próprios gostos e experiências e da forma como estas coisas influenciam em como aproveitamos os jogos e irão refletir em nossa opinião.
Assim como nosso relacionamento é melhor ou pior com determinadas pessoas, baseado em nossos pontos de conexão, o mesmo vale para análises feitas por elas. Análises feitas por pessoas com gostos e experiências similares às minhas serão mais valiosas para meus objetivos.
Review é opinião
Review sem opinião é sinopse… definitivamente não é aquilo que eu busco em um review.
Assim como livros, filmes ou quadrinhos, jogos são consumidos também em nível emocional e tentar excluir das análises a sua experiência pessoal com aquele título não é apenas um trabalho inútil, como também tende a tornar o material enfadonho e desnecessário. Afinal, se estamos buscando um memorial descritivo do jogo, trailers e releases tendem a cumprir esta função.
Emoção não significa, necessariamente, um jogo feito para chorar ou algo do tipo. Em um dos meus últimos reviews aqui no Doze Bits, falo sobre como Doom: Eternal é frenético e me passa uma sensação de intensidade, ao ponto de ser exaustiva para longas sessões de jogo… isto também é uma emoção.
Claro que elementos técnicos, como a qualidade gráfica e sonora ou mesmo a existência de bugs no jogo podem (e até devam) constar na análise, mas mesmo quando considerada em seus critérios puramente técnicos, o impacto destas questões é pessoal. Um avaliador pode adorar a sensação de diversão e empoderamento oferecida por Crackdown 3, mesmo com seus gráficos simples… enquanto outro pode achar que os problemas técnicos de The Last Guardian mancham o jogo ao ponto de não permitir que ele aproveite sua narrativa.
Pessoas tem gostos diferentes
Se eu tenho um amigo que odeia sushi, não é para ele que eu vou perguntar sobre o novo restaurante japonês que abriu na minha cidade.
A quantidade de gêneros que os jogos podem atender é tão grande e tão cheia de intersecções ao ponto de que atualmente é até difícil enquadrar certos títulos em um único (ou mesmo diversos) gênero. Tão grande quanto, é a gama de gostos que um jogador e avaliador podem ter.
Eu adoro jogos narrativos, ação e aventura, RPGs ocidentais e – acima de tudo – jogos de furtividade. A minha opinião – seja ela técnica ou não – é irrelevante para um amante de FIFA, Forza ou qualquer outro título esportivo, bem como jRPGs ou MMOs.
Assim, eu costumo buscar a opinião de pessoas com gostos parecidos com os meus, pois a análise deles é muito mais útil para eu tomar uma decisão de compra sobre um jogo, por exemplo.
Notas existem em si, mas não servem como comparativo
Bem, quem acompanha meus reviews no Doze Bits já deve ter percebido que há algum tempo não dou nota para os jogos (mesmo na época em que dava, era minha parte menos favorita no desenvolvimento de uma análise). Isto porque eu acredito que as notas surgem como uma informação frequentemente considerada de forma equivocada.
Necessárias por fins editoriais (uma parcela considerável dos leitores busca apenas a nota de um review, e nada mais, de modo que análises sem notas recebem menos atenção), a nota de um jogo existe em si, sendo uma péssima ferramenta de comparação entre eles.
Novamente, a ideia de basear notas em critérios puramente técnicos beira o ridículo, devido ao fato de jogos serem consumidos em nível também emocional e suas experiências e gostos pessoais influenciarem sua relação com o título. Até mesmo sua expectativa original pode influenciar na nota, fazendo com que jogos muito esperados e que decepcionem sejam classificados com maior rigor do que aqueles dos quais você já não esperava muito.
Tentar usar notas como comparativo é ainda mais ineficaz, pois assim como mencionei acima, a variedade de orçamentos, pretensões e gêneros de jogos é gigante. Esta é a minha birra com notas, pois elas dão a entender que existe um parâmetro de comparação entre incomparáveis e tentar usá-las para organizar – em uma escala de valor – títulos como What Remains of Edith Finch, To The Moon, Forza Horizon e Zelda: Breath of the Wild não faz qualquer sentido.
Experiência prévia não é um requisito
Para avaliar Uncharted 4, não é necessário ter jogado os 3 jogos anteriores e o spin-off para Playstation Vita. O único item que eu julgo realmente importante em um review é a franca honestidade.
Se um avaliador deixa claro que ele está jogando o título sem ter jogado os anteriores, seu review é muito valioso para quem também venha a experimentar o jogo sem ser um fã assíduo da franquia. Da mesma forma, eu – como um fã da série – irei procurar avaliações feitas por quem também jogou todos os anteriores, pois é o ponto de vista similar ao meu.
Jogar o jogo inteiro, também não
Ok, possivelmente esta aqui será a mais polêmica, mas vou contar uma breve história para explicar o motivo de realmente acreditar nisto.
Sou um grande fã da franquia The Witcher e no lançamento da série no Netflix eu busquei ler algumas análises e opiniões sobre ela. Obviamente, fui parar na infame nota Zero dada pelo site Entertainment. Lendo a análise, não consegui conter minha raiva na medida em que descobria que os dois avaliadores sequer viram a série completa, julgando-a simplesmente muito chata para continuar após dois ou três episódios.
Passada a irritação, lembrei de diversos jogos dos quais eu já desisti de jogar e dei-me conta de que eles estavam sendo extremamente honestos em sua análise. Para alguém que segue, se importa e consome a opinião deles, existem poucos reviews mais esclarecedores do que “assisti três episódios e achei tão chato que não quis mais continuar”. Certamente, as pessoas que gostam do mesmo tipo de série que eles gostam, também não irão curtir The Witcher.
Quando joguei Mafia III (um review que, infelizmente, nunca subi para aqui para o site), ficou ainda mais claro para mim o quanto uma opinião honesta baseada no consumo incompleto do jogo pode ser valiosa… se você curte jogos de furtividade, mundo aberto e boa narrativa, como eu curto, fica aqui meu review express: “Mafia III é tão moroso e entediante que eu desisti do jogo mais ou menos na metade”.
Honestidade é o mais importante para o review.
Bancando o sommelier de review
Então, esta é a minha pequena lista de opiniões sobre reviews e como eu os entende em busca de um consumo mais saudável, que não vá incomodar a minha, nem faça eu encher o saco dos revisores que não compartilham minha opinião.
Em resumo, eu entendo que reviews são úteis para ajudar a definir uma compra ou então para comparar as reações a um determinado título com as minhas próprias e também que elas são opiniões pessoas sobre obras dos mais diversos gêneros, sendo – por consequência – extremamente diversas.
Por isto, busco analistas que tenham gostos e experiências similares aos meus, deixando para lá a opinião daqueles que desgostam dos gêneros que eu aprecio ou se relacionam e consomem jogos de forma diferente. Certamente existem outras pessoas como eles e que – por sua vez – apreciarão seu conteúdo.
Desde então, ficou cada vez mais raro eu me arrepender de comprar ou jogar um título escolhido com base nos meus revisores favoritos!
Designer por profissão e gamer de coração, Raphael é apaixonado por jogos que sejam imersivos e permitam que ele se esgueire por trás de seus inimigos, eliminando-os de forma silenciosa e impiedosa.